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segunda-feira, 11 de setembro de 2017

A Justificação Pela Fé e o Ensino Ortodoxo




Para a maior parte da história da Igreja, a salvação foi vista como compreendendo toda a vida: os cristãos creram em Cristo, foram batizados e foram nutridos em sua salvação na Igreja. A chave para a compreensão dos ensinamentos sobre a Fé, está centrada em torno da Santíssima Trindade, da Encarnação do Filho de Deus e da expiação.

Leão X, Papa de Roma
Reformadores
Na Europa Ocidental, durante o século XVI e, até mesmo antes, no entanto, uma justificável preocupação surgiu entre os Reformadores acerca da compreensão predominante de que a salvação dependia de obras humanas meritórias, e não da graça e piedade de Deus. A redescoberta deles de Romanos 5, os levou a adotar o slogan Sola Fides: justificação apenas pela fé.

O debate da Reforma no Ocidente suscitou a seguinte questão para o Oriente Ortodoxo:

Que novidade é esta em polarizar a fé e as obras? Pois, é estabelecido desde a era apostólica que a salvação foi concedida pela misericórdia de Deus para homens e mulheres justos, ou seja, aqueles que são batizados em Cristo, são chamados a crer nele e a praticar boas obras (Efésios 2:8-10). Uma oposição entre a fé e obras é algo sem precedentes no pensamento Ortodoxo.

O ensino Ortodoxo da justificação difere do Protestante de várias maneiras:

1. A Justificação E A Nova Aliança.

Quando os Cristãos Ortodoxos abordam a doutrina da salvação, a discussão gira em torno da Nova Aliança. A Justificação (estar ou tornar-se Justo pela fé em Deus) é o primeiro fruto de quando se é trazido para uma relação de aliança com Ele.

Tal como Israel outrora estava sob a Antiga Aliança, na qual a salvação viria pela fé, como está revelado na Lei (Rm 3:21,31), assim, também, a Igreja está sob a Nova Aliança. A salvação vem pela fé em Cristo, que cumpre a Lei. Recebemos o Dom do Espírito Santo, que habita em nós, levando-nos para o conhecimento de Deus, o Pai (Rm 8:4,15). Em vez de justificação como uma absolvição legal perante Deus, os Fiéis Ortodoxos veem a justificação pela fé como um relacionamento de aliança com Ele, centrado em união com Cristo (Rom 6: 1-6).

2 A Justificação E A Misericórdia De Deus.

A Ortodoxia enfatiza primeiramente é a misericórdia de Deus – e não nossa fé - que nos salva.:

«Portanto, tendo sido justificados pela fé, temos paz com Deus através de nosso Senhor Jesus Cristo, através do qual também temos acesso por fé a essa graça em que defendemos, e nos regozijamos na esperança da glória de Deus» (Rom 5: 1, 2). É Deus Quem inicia ou faz a Nova Aliança conosco.

3 A Justificação Pela Fé É Dinâmica, Não Estática.

Para os Cristãos Ortodoxos, a fé é viva, dinâmica, contínua - nunca estática ou meramente pontuado no tempo. A fé não é algo que um cristão exerce apenas em um momento crítico (como no caso da conversão, esperando que ela cubra todo o resto de sua vida.

A verdadeira fé não é apenas uma decisão, é uma forma de vida. Assim, o Cristão Ortodoxo vê a salvação, em pelo menos três aspectos: (a) Eu fui salvo, juntando-me a Cristo no Santo Batismo, cf. Gálatas 3:27 e Rm 6:4; (b) eu Estou sendo salvo, crescendo em Cristo através da vida sacramental da Igreja, Cf João 6:54-57 e Efésios 4:1-13; e, (c) serei salvo, pela misericórdia de Deus no Juízo Final, Cf. 2 Timóteo 4:7,8.

A Justificação pela fé, embora não seja a principal doutrina do Novo Testamento para os Ortodoxos como o é Para os protestantes, não representa nenhum problema. Mas, a doutrina justificação pela fé tem da nossa parte uma objeção, quando se diz que a salvação é somente pela fé, sto contradiz a Escritura, que diz:

«Vê então que um homem é justificado pelas obras, e não pela somente fé » (Tg 2:24).

Somos «justificados pela fé, sem as obras da lei» (Romanos 3:28); mas, em lugar algum a Escritura diz que somos justificados «somente» pela fé. Pelo contrário, a fé por si mesma, se não tem obras, está morta (Tg  2:17).

Como cristãos, não estamos mais sob as exigências da Lei do Antigo Testamento (Rm 3:20), porque Cristo cumpriu a Lei (Gálatas 2:21; 3:5,24). Pela misericórdia de Deus, somos trazidos para um novo relacionamento de aliança com Ele. Nós, os que cremos, recebemos entrada em Seu Reino por Sua graça. Através da Sua misericórdia, somos justificados pela fé e capacitados por Deus para as obras ou ações de justiça que lhe trazem glória:

«Porque a graça salvadora de Deus se há manifestado a todos os homens, ensinando-nos que, renunciando à impiedade e às concupiscências mundanas, vivamos neste presente século sóbria, e justa, e piamente, aguardando a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Senhor Jesus Cristo; O qual se deu a si mesmo por nós para nos remir de toda a iniquidade, e purificar para si um povo seu especial, zeloso de boas obras.» Tito 2:11-14

«Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas.» Efésios 2:10

«Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus.» Mateus 5:13-16


4 comentários:

Unknown disse...

artigo otimo,esclarecedor e transparente,parabens padre matheus,eu que ja fui protestante,vejo como o que eu acreditava estava imcompleto.

Fabiano Dias disse...

Boa tarde, Padre.

Bom, a questão da justificação pela fé não pode ser entendida sem antes compreender o conceito de "regeneração". Se "a salvação é somente pela fé e não pelas obras" for tomada ao pé da letra, de fato, pode-se chegar a conclusão errônea de que as obras são desnecessárias. E não é isso que nós, protestantes, entendemos.
A Salvação é pela graça de Deus mediante a Fé em Cristo. Ponto. Nada mais. Não podemos ser salvos pelas obras. As obras não salvam. Ponto.
Mas como admitir isso sem cair numa negação das obras? Como entender isso sem entrar em contradição com passagens da Escritura que dão a entender que as obras são necessárias para a salvação?
Uma só palavra: Regeneração. Uma vez que cremos- e cremos realmente em Cristo, não podemos mais ser quem eramos, quem sempre fomos. A Fé genuína deve operar a mudança - do contrário, não é uma fé viva, é uma fé morta. E uma vez que alguém crê realmente em Cristo, este morre para o mundo, e renasce, tornando-se uma nova Criatura e passando por um processo chamado "regeneração", onde o Espírito Santo obrará na vida dessa pessoa, aperfeiçoando-a e conduzindo-a até atingira estatura e a semelhança de Cristo.
Assim essa nova criatura, que agora vive em Cristo, realiza as boas obras, não para ser salva, mas porque agora é de sua natureza. De sua nova natureza. A árvore má produz maus frutos, a árvore boa produz bons frutos. Lutero, ao explicar isso diante de uma pergunta, respondeu: "perguntar se o Cristão deve fazer boas obras é tão desarrazoado quanto perguntar se uma pereira deve produzir peras..."
Então, a justificação pela fé não anula a necessidade de obras. Anula sim a idéia de que é necessário fazer boas obras para ser salvo. Mas o salvo, aquele que encontrou a nova vida em Cristo, faz boas obras naturalmente. Deve fazê-lo. Pois só assim é que demonstra realmente aquela transformação que ocorreu e continua a ocorrer em seu interior.

Senti necessário fazer esse comentário, porque há muita confusão quanto a justificação pela fé. A Sola Fide não culmina em uma fé morta. Mas justamente a fé viva - a fé que transforma.

Deus o abençoe, Padre.

Fabiano Dias.

Luan disse...

Olá Padre Matheus,Salve Maria, eu sou católico romano mas admiro muitos aspectos da fé ortodoxa oriental, aproveitando a postagem sobre a justificaçao pela fé, eu gostaria de perguntar se a teologia ortodoxa ensina a possibilidade da perda da salvação, como ensinado no Catolicismo Romano ou segue a doutrina protestante calvinista que diz que é impossível perder a salvação.

LUIS MANOEL SIQUEIRA disse...

Muito bom seu comentário.