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quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Russofobia Como Expressão do Ódio Europeu ao Cristianismo










Hoje em nosso Observatório reproduzimos o conteúdo postado pelo Padre John A. Peck da Igreja Ortodoxa na América (Orthodox Church in America - OCA), em seu sitio "The Ortodoxo Church of Tomorrow", que traz entrevista concedida pela renomada jornalista dinamarquesa e teóloga católica romana, Iben Thranholm. Originalmente a entrevista é publicada sob o Título: "A Rússia e o Ocidente Trocaram os Papéis, Espiritual e Cultural" (Russia and the West Have Swapped Spiritual and Cultural Roles). A matéria destaca as seguintes frases da Jornalista e Teóloga:



Iben Thranholm
"Os russos estão voltando ao cristianismo em um contexto moderno e contemporâneo". 
"Eles estão familiarizados com o fruto amargo do ateísmo e não têm apetite para o deserto desolado e estéril que o ateísmo produziu". 
"Na Rússia, o cristianismo está associado ao que é ser moderno e progressista".

"O jovem, o que está na vanguarda, os eruditos e os ricos expressam seu Cristianismo como algo completamente natural e normal da vida.".  
“Hoje, o espírito do comunismo mostra-se na adoração ocidental aos direitos humanos, à liberdade de expressão e noções utópicas das elites das chamadas sociedades abertas. Estamos nos atolando profundamente no terreno pantanoso do qual os russos se sentiram aliviados ao deixá-lo para trás." 
"Os russos percebem ativistas tais qual a 'Pussy Riot' como os últimos dias bolcheviques".

Iben Thranholm, organizou uma série de cinco programas intitulada "From Russia with Love", na rádio Estatal dinamarquesa, Radio 24syv, com o subtítulo "Um Olhar Imparcial Para a Rússia de Putin."

Inspirada no Imperador Constantino, ela acredita que o Cristianismo no Ocidente pode ser rejuvenescido pela perspectiva do Oriente. Iben está consciente da enormidade da tarefa:

"Essa (tarefa), infelizmente, tem a mesma profundidade do ódio ao cristianismo no qual o Ocidente está afundado", diz a teóloga, que não hesita em defender o Presidente Putin, a quem a mídia ocidental se deleita em acumular escárnio e desprezo. 

"O caso da Pussy Riot abriu para mim a porta para a Rússia", explica a jornalista.

"Eu entendi que a Rússia é um país que se recusa a secundarizar os valores cristãos. A Rússia não é apenas um país ou uma nação, a Rússia é um conceito espiritual, um estado de espírito. A crítica ao presidente Putin não foi o crime pelo qual as ativistas foram julgadas e condenadas. O seu crime foi a invasão da Catedral Cristo Salvador, o mais sagrado dos lugares, encenando um ato de blasfêmia na frente do iconostase[1].

No Ocidente, a liberdade de expressão é amplamente implantada com a finalidade de profanar a religião, mas a Rússia não permite que a blasfêmia invada esta fronteira. Isso realmente me fascinou, e foi por isto que eu viajei a Moscou, para aprender mais disso, o que resultou em uma série de programas de rádio que tenta ajudar os dinamarqueses, proporcionando-lhes uma visão diferenciada da Rússia, que está além da mediocridade dos clichês e das caricaturas depreciativas."


Qual foi sua impressão da Rússia?
"Eu experimentei uma energia fantástica, uma energia moral semelhante à da América nos anos 50, com os valores morais antigos. Eu encontrei solidariedade, poesia e uma cultura onde as pessoas alimentam um espírito de auto-sacrifício que eu não tenha visto antes. A atmosfera em Moscou é completamente diferente da de qualquer capital da Europa, e ao contrário daqui no Ocidente, eu me sinto muito mais espiritualmente livre no Oriente. 
Enquanto o Ocidente se deleita em ridicularizar e renegar o Cristianismo (e a Europa lhe tem verdadeira aversão); os russos estão se voltando ao Cristianismo em um contexto moderno e contemporâneo. Lembre-se que o Cristianismo foi reprimido sob o comunismo, que era ateu. Os russos estão familiarizados com o fruto amargo do ateísmo e não têm apetite para o deserto desolado e estéril que produziu. 
O interessante é que, na Rússia, o Cristianismo está associado ao ser moderno e progressista. O jovem, o que está na vanguarda, os eruditos e os ricos expressam seu Cristianismo como algo completamente natural e normal da vida. O cristianismo é simplesmente elegante, mas não da maneira pop e superficial do Ocidente. As raízes do Cristianismo crescem profundamente no solo da vida russa, e olham com espanto a forma como nós protegemos, ou melhor, desprezamos, a nossa herança espiritual. 
Não só isso: Eles discernem em nossa obsessão com o politicamente correto, e no patrulhamento social que a mídia e a universidade exercem sobre as opiniões, uma nova manifestação do terror e do totalitarismo dos quais eles tiveram a bênção de escapar depois de 75 anos terríveis. 
Após a Guerra Fria, Leste e Oeste trocaram de papéis, espiritual, cultural e moralmente falando. O Marxismo Cultural agora reina desenfreado no Ocidente.


Mas o Comunismo e a Social Democracia provavelmente não são a mesma coisa?
"Deixe-me colocar de forma diferente. Durante o domínio do comunismo, a Rússia viu-se de braços com uma cultura de morte (mas ela está voltando à vida) - no sentido da cultura cristã - com uma forte consciência de estar em continuidade com suas raízes históricas. 
A situação no Ocidente é completamente oposta. Nós celebramos a morte e nos rendemos à visão satânica do homem, através de uma retórica hipócrita e irada contra Deus. Nós podemos nos divorciar pela internet; nós priorizamos o trabalho e carreira acima das responsabilidades familiares, especialmente a educação dos filhos; somos a favor da eutanásia, do aborto, dos direitos dos homossexuais e casamento de mesmo sexo, enquanto nossas cidades estão submersas no Islã e na segregação crescente. 
A Rússia optou por uma direção completamente diferente, é por esta razão que muitos russos percebem ativistas tais qual a 'Pussy Riot', como os bolcheviques dos últimos dias. Elas invadiram e profanaram a santidade da igreja, um lugar sagrado. O Ocidente celebra isto como progresso e avanço. Os russos estão lembrados de que o espírito do comunismo ainda está vivo. Ele simplesmente assume novas formas e passa a residir no Ocidente, onde liberais e progressistas amam e adoraram "Pussy Riot". 
Hoje, o espírito do comunismo mostra-se na adoração ocidental aos direitos humanos, à liberdade de expressão e noções utópicas das elites das chamadas sociedades abertas. Estamos nos atolando profundamente no terreno pantanoso do qual os russos se sentiram aliviados ao deixá-lo para trás. O Patriarca Kirill alertou o Ocidente: 
Patriarca Kiril
'Não sigam pelo caminho que fizemos. Tentamos ir por esta via e ela nos levou à destruição!' "

Recentemente, o Exército Russo realizou um exercício com base no cenário de um ataque ao norte da Noruega, Aaland, Gotland e Bornholm. Será que basta virar a outra face?
"Bem, esta não é a verdadeira maneira de olhar para eles. Os russos realizaram esse exercício por causa da pressão geopolítica que a OTAN criou, posicionando forças militares hostis ao longo da fronteira com a Ucrânia e nos antigos países do Pacto de Varsóvia. 
A política externa russa tem sido demonizada. A Rússia é obrigada a responder a uma situação que ela não criou, e isto não é a mesma coisa de agressão. Por que a Rússia deveria aceitar ter seu acesso ao mar cortado, de São Petersburgo a Vladivostok? Tal coisa é impensável. Com hipocrisia deslavada, o Ocidente faz parecer que a Rússia é o nosso novo inimigo. A verdade é exatamente o oposto. O Ocidente é o seu próprio pior inimigo.


COMENTÁRIO

Pe. Mateus
O cenário do noticiário internacional montado pela Impressa do Ocidente, tem dedicado destaque à Russia, sempre descrita como o "Império do Mal". O interessante é que nos noticiários, nunca temos a fala dos russos pela boca dos seus líderes e imprensa, apenas, alhures, algumas citações, sempre acompanhadas de comentários céticos da veracidade de suas razões e intenções, especialmente quando se trata de seu maior líder, Vladimir Putin, tratado sob constante suspeita, mas que vem dando um verdadeiro espetáculo de diplomacia e de capacidade de liderança. 
Porém, nossa motivação em tratar deste tema, é porque sabemos que na raiz deste conflito, não está simplesmente uma disputa de hegemonia política, mas um conflito e confronto de duas maneiras de ver o mundo, ou seja, o Cristianismo x o Humanismo Agnóstico e Secular, que tem tomado conta das sociedades Ocidentais, se tornando a mentalidade predominante das elites dos formadores de opinião. Os Cristãos Ocidentais, em sua maioria, sentem os efeitos da hostilidade, mas, não conseguem discernir o inimigo e nem suas estratégias, ao contrário, de forma tola veem no inimigo, o amigo e ainda o constituem como referência; chegando até mesmo, a moldar o pensamento teológico à ideologia dominante: o individualismo, a secularização, a subordinação do pensamento teológico ao científico, o culto à ideologia de mercado e ao pragmatismo e utilitarismo do capitalismo. Os únicos temas que os cristãos ocidentais ainda não se afinam totalmente, são os de cunho moral, tais como a homossexualidade e o aborto; no mais, o erotismo, a sensualidade, a luxúria, a avareza, a glutonaria e a vaidade, continuam temperando a mente de muitos cristãos. 
Os cristãos do Ocidente também ignoram quase que por completo sua própria história, as origens do Cristianismo,  e por isto mesmo desconhecem a Igreja Ortodoxa. O que deveria lhe ser familiar, lhe parece estranho e até mesmo utópico. Não sabem que o Cristianismo Ortodoxo moldou as grandes civilizações, tais como o Império Romano do Oriente (dito Bizantino), a Grande Civilização Russa, além de influenciar consideravelmente o Império Persa, o Império Mongol no extremo Oriente e as civilizações do Norte e Nordeste da África. 
A história conhecida (quando é conhecida) pelos Cristãos Ocidentais, é à da Europa Ocidental Medieval (Bárbara e Feudal), na qual se formatou o Cristianismo Romano Católico; é à da Europa Ocidental Moderna (onde se forjou o Protestantismo, o capitalismo, o cientificismo e o secularismo, que desembarcou no socialismo ateu e nas sociedades social-democráticas agnósticas); e à das Américas, marcadas pelas duas mentalidades da Europa Ocidental (medieval e moderna). 
Não é à toa que tais Cristãos não consigam identificar seus reais inimigos, tendo-os como amigos, e que as sociedades formatadas pelo Cristianismo Ortodoxo (que é o das origens), lhes pareçam estranhas e e até mesmo adversárias. A inversão de valores, ou seja, o chamar as trevas de luz e a luz de trevas; o bem de mau e o mau de bem, é a astúcia predileta da "Antiga Serpente", a pedra de tropeço preferida de "Satã, o Grande Adversário", a natureza do Anticristo, que opera sinais e prodígios fraudulentos (da mentira). 
No dia 07 de janeiro deste ano, cinco cartunistas do tabloide francês "Charlie Hebdo" foram assassinados por terroristas que invadiram a redação do jornal, e provocaram a chacina em represália às agressões e deboches contra a fé islâmica promovida pelo periódico. Toda imprensa Ocidental (que eles intitulam de imprensa mundial), ficou estarrecida e Chefes de Estado ou seus representantes, imediatamente se dirigiram para a França afim de participarem de uma passeata solidária. O estranho é que, apenas 4 dias antes à chacina francesa, o "Buko Haram" (grupo terrorista islâmico que atua no oeste da África massacrou um número estimado de 2.000 cristãos, destruindo 3.700 habitações; e em resposta à este massacre houve um silêncio tumular dos Estados Unidos, Europa Ocidental, ativistas de Direitos Humanos e etc. Há mais de uma década que o Patriarcado de Moscou vem denunciando na ONU o massacre dos cristãos no Oriente, mas estas denúncias caíram sempre no vazio, até que surgiu o Estado Islâmico, que até à intervenção da Rússia em 30 de setembro, estranhamente atuava praticamente impune. 
Os Cristãos Ocidentais ainda não se aperceberam quem são os seus reais inimigos. Os noticiários do Brasil procuram isolar o país do cenário mundial, sem promover qualquer informação qualitativa do que vem a ser o "BRICS", sua proposta de um mundo multipolar e o papel das potências emergentes no cenário planetário; e concentram suas manchetes em escândalos utilizados na disputa entre partidos que são cunhados na mesma moeda, ou seja, o materialismo e o humanismo secular, os quais brigam entre si para ver quem vai ser "cara" ou "coroa". 
O ódio das grandes Potências Ocidentais pela Rússia, se deve ao fato de que o povo russo, inspirado por suas raízes históricas do Cristianismo Ortodoxo, se pôs como obstáculo às pretensões das Sociedades Ocidentais, que em nome da democracia, promovem todo tipo de inversão de valores e ódio ao Cristianismo. A sua ira deve-se ao fato que agora eles têm como opositor um povo de um lastro cultural invejável, detentor de tecnologias de ponta e militarmente capacitado para enfrentar qualquer nação deste mundo. Então, entre em cena a velha estratégia, que entende que se o inimigo é forte, melhor do que o encarar, é tentar fazer com que caia em descrédito. 
Padre Mateus


[1] * Iconostase, do grego "είκονοστάσιον". Uma parede ornamentada com ícones separando o santuário do corpo da igreja, e aberta por três portas, simbolizando o portal pelo qual a adoração terrena ultrapassa a dimensão do tempo e se une às realidades celestial e eternas.

Um comentário:

Unknown disse...

que texto excelente!!!