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sexta-feira, 20 de julho de 2007

Roma e a Igreja Católica (I)

A divulgação da Declaração "Resposta a Questões Relativas a Alguns Aspectos da Doutrina Sobre a Igreja" de autoria da "Congregação Para a Doutrina da Fé" da Igreja Romano-Católica, foi acolhida e divulgada pela imprensa em tons distorcidos e (quem sabe?), talvez, até sob a expectativa de um tiroteio entre as comunidades cristãs. Equívocos, porque a rigor, o Vaticano em momento algum afirma ser a Igreja de Roma a "única igreja verdadeira" como alguns querem compreender. Ela fala em "subsistência", mas, não em verdade, ao contrário, o texto afirma categoricamente:
"...segundo a doutrina católica, é correcto afirmar que, nas Igrejas e nas comunidades eclesiais ainda não em plena comunhão com a Igreja católica, a Igreja de Cristo é presente e operante através dos elementos de santificação e de verdade nelas existentes..."
No entanto, a afirmativa posterior a esta é de que a igreja católica subsiste plenamente nas Igrejas sob a chefia de Roma; isto por causa da tradição romana (porém, não católica) de ser o Papa Romano (posto que na Igreja Católica outros bispos também são chamados de Papa) a Cabeça Visível da Igreja e fonte da unidade visível da Igreja de Cristo. Neste mesmo documento, o Vaticano reconhece a legitimidade da Igreja Ortodoxa, admite a existência de laços estreitíssimos entre as duas igrejas e as chamas de irmãs, com a ressalva de que existe uma situação lacunosa pelo fato das Igrejas Ortodoxas não aceitarem a doutrina da chefia do Papa Romano. A dimensão realmente mais desconfortável fica por conta da concepção em relação às comunidades da Reforma, posto que nelas estejam ausentes vários e basilares elementos que caracterizam a identidade católica, mesmo assim, o documento reconhece que o Espírito Santo utiliza-se destas comunidades como de instrumentos de salvação, cujo valor deriva da mesma plenitude da graça e da verdade que foi confiada à Igreja católica.
A maioria da população (inclusive muitos líderes de igreja) não leu o texto do Vaticano e absorveu a notícia (veiculada sem dar voz à Roma) permitindo que cada um a entendesse do seu modo e bel-prazer.
A rigor, também, nós Ortodoxos não somos compreendidos perfeitamente, quando afirmamos - por razões teológicas e históricas - ser a Ortodoxia a autêntica fé pregada por Cristo, transmitida pelos Apóstolos e preservada incólume (sem adições e nem subtrações) ao longo de todos os séculos, em legítima e inquestionável sucessão apostólica.
O que é lacunosa, na verdade é a compreensão que muitos católicos romanos têm da identidade de sua igreja. Todos pensam que em toda a parte do mundo a igreja católica romana é uma instituição monolítica, ou seja, que em todos os povos se celebra o mesmo rito, mantêm-se as mesmas tradições e disciplinas que os católicos romanos estão acostumados a ver no Brasil. Na verdade, a Igreja Católica Romana é a maior e a líder de um conjunto de 23 igrejas autônomas (igrejas que se autogovernam - sem a interferência direta do bispo de Roma, onde os sacerdotes podem casar, os féis participam do pão e do vinho, em vez de hóstia come-se o pão com fermento, ao invés de imagens de escultura usam ícones, os clérigos usam barba e etc...). De fato estas igrejas têm a cara da Igreja Ortodoxa, mas estão ligadas a Roma muito mais por razões históricas do que teológicas. É bom lembrar também que a própria Roma por quase mil anos seguia estas mesmas tradições e disciplinas.
Num mundo fragmentado como este que vivemos o diálogo ecumênico se faz mais do que necessário. Todavia o diálogo não pode e nem deve ser um ato teatral e meramente diplomático. É preciso que este diálogo trafegue pela via de um espírito fraterno, respeitoso e ao mesmo tempo claro e preciso (sem ambigüidades e ambivalências de palavras e gestos).
Acredito que o documento do Vaticano é inadequado ao ecumenismo das fotos e das cerimônias públicas e dos gestos externos de deferência e sorrisos largos. No entanto, ele é extremamente útil ao diálogo honesto, onde a consciência de si não é negada e nem mascarada, pois, somente o Espírito da Verdade, procedente do Pai e a nós enviado pelo Filho, pode gerar a consciência comum. Por esta razão, a Liturgia Bizantina - de forma insistente e incessante - inicia-se com as seguintes petições:
Diác. - Em Paz, oremos ao Senhor.
Coro - Kyrie, eléison! (Senhor, tem piedade)
Diác. - Para que ele nos conceda a Paz celeste e a salvação de nossas almas, oremos ao Senhor.
Coro – Kyrie, eléison. (Senhor, tem piedade)
Diác. - Para que reine a Paz no Universo, pela prosperidade das Santas Igrejas de Deus e pela união de todos, oremos ao Senhor.
Diác. - Kyrie, eléison! (Senhor, tem piedade)

Um comentário:

Unknown disse...

Muito esclarecedor.
Gostei muito! Principalmente pelo espaço virtual, onde podemos está em contato com os irmãos nessa era de globalização e internet. Onde ninguém tem "tempo".


Kennedy Seixas