sábado, 29 de dezembro de 2012

Maria é a Mãe de Deus?



Comentário do Artigo "Maria, Outra Redentora?" de James R. White

Publicado em Internautas Cristãos


O III Concílio Ecumênico usa o termo "Theotokos" - aplicado a Maria - numa perspectiva Cristológica, como parcialmente percebe o Autor deste artigo; porém se equivoca quando analisa a expressão "Mãe de Deus" como inadequada e imprópria. Maria é chamada "Mãe de Deus" porque, primeiramente, é assim que o Espírito Santo a designa nas Sagradas Escrituras (Lc 1:41-43).  Isabel, CHEIA DO ESPÍRITO SANTO, a chama de "MÃE DO MEU SENHOR". "Cristo é o SENHOR" foi o primeiro Credo da Igreja (1 Cor. 12:3), escandalizando os judeus, cujo raciocínio teológico os levava a crer que fazer de um homem Deus era simplesmente uma blasfêmia inaceitável.

Mas Cristo embaraçou o raciocínio dos teólogos judeus, exatamente com o argumento da encarnação do Messias:
"E, estando reunidos os fariseus, interrogou-os Jesus, Dizendo: Que pensais vós do Cristo? De quem é filho? Eles disseram-lhe: De Davi. Disse-lhes ele: Como é então que Davi, em espírito, lhe chama Senhor, dizendo: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, Até que eu ponha os teus inimigos por escabelo de teus pés? Se Davi, pois, lhe chama Senhor, como é seu filho? E ninguém podia responder-lhe uma palavra; nem desde aquele dia ousou mais alguém interrogá-lo" (Mateus 22:41-46).

Visita de Maria a Isabel

Assim, Davi, pelo Espírito Santo chama o Cristo de Senhor (Deus); Os Apóstolos, pelo Espírito Santo dizem: Cristo é o Senhor (Deus) e Isabel, cheia do Espírito Santo diz de Maria: "Mãe do Meu Senhor (Deus)". "Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às Igrejas".

Contudo, apesar da clareza das Escrituras, ainda existem pessoas que dizem que o termo "Senhor", ainda que sendo o mesmo vocábulo, na fala de Isabel não quer dizer "Deus".

Esta preciosidade de lógica assim raciocina:

Quando o Espírito Santo por Davi diz que o Filho é o Senhor, Ele o está chamando de Deus;

Quando os Apóstolos pelo mesmo Espírito chamam Cristo de Senhor, o está chamando de Deus;

Mas, que quando Isabel pelo mesmo Espírito diz "Mãe do meu Senhor", não está dizendo que ela é mãe de Deus. 

Acho que muito mais do que uma lógica exegética, os que assim elocubram, precisam mesmo é de honestidade em suas falas e temerem a Deus, pois, se o termo "Senhor" na boca de Isabel não quer dizer Deus, então os que assim interpretam, negam, subsequentemente, a Divindade da Criança que Maria trazia em seu ventre. Assusta-me ver até onde as passionalidades podem nos levar.

Transmissão genômica
Em segundo lugar, a expressão "Mãe de Deus é pertinente" porque Maria fornece seus genes (como oblação) para que o Verbo Eterno (que não possuía carne) pudesse ter uma existência biológica. É uma epiclesis eucarística, pois o Espírito Santo fecunda a sua carne. 
"Eis aqui a serva do Senhor; cumpra-se em mim segundo a tua palavra". (Lucas 1:38)". 
Maria, a Segunda Eva,
a Mulher Vestida do Sol
que vence o Dragão, a antiga Serpente
A encarnação não se deu por um estupro celeste. Houve um assentimento da Virgenzinha de Belém. Ao contrário de Eva, ela não acolhe a palavra da Serpente e nem se alimenta da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mau, mas, livremente acata a Palavra Divina e se alimenta da Árvore da Vida. Assim como a Árvore Maldita entranhou a natureza de Eva, assim a Árvore da Vida santifica a natureza de Maria, a segunda Eva. A primeira gera os filhos para morte, a segunda Aquele que dá a vida. Todo genoma de Cristo Ele o herda de Maria. De maneira que Seu biótipo, Sua estrutura psicológica, tudo em sua biologia é herdado dela. O que nos maravilha de forma inefável nesta contemplação da Graça Divina em se unir à criatura humana, é que todo o material genético do Sangue ofertado na cruz, é retirado de Maria. Isto não a torna absolutamente co-redentora, mas lhe confere a primazia, pois ela é a primeira a comungar do Corpo e do Sangue de Cristo, não precisando ingerir nem pão e nem vinho, pois estes elementos eram sua própria carne e seu próprio sangue.



Abraão hospedando
a Santíssima Trindade (Gn 18)
O Autor teme que a exaltação da Virgem a coloque numa condição quase divina e, assim, “roube” a glória de Deus. Ora, o objetivo da nossa redenção é nos fazer chegar à estatura de Cristo (Ef. 4:13), a nos fazer ontologicamente totalmente iguais a Ele (Rm. 8:29), ou seja, alcançarmos a nossa deificação ao entrarmos em plena comunhão com a Santíssima Trindade (João 17:1-3, 20-24).

Esta deificação é prefigurada já na Antiga Aliança, conforme esclarece o próprio Cristo, que diz que aqueles que entraram em contato com Ele em teofanias do Velho testamento foram chamados de “deuses”(Sl 82:6; João 10:34,35). Ora, se àqueles que apenas de longe entraram em contato direto com o Verbo Eterno lhes coube apropriadamente serem chamados de “deuses” (elohim) quanto mais àquela que se tornou simbiótica em seu ser com o Eterno, gerando-lhe a existência biológica, cabe o título “Mãe (genitora) de Deus”?

Criação de Adão e Eva
A Escada de Jacó
Assim, Maria, não só prefigura - como os Profetas da Antiga Aliança - a união hipostática da criatura humana com o Criador, mas nela a Graça vai mais além: Maria se torna a antecipação escatológica (antecipa no tempo) esta realidade última da humanidade redimida. Por isto o Anjo a reverencia dizendo: 



“Rejubila-te, ó portadora de graça inefável" (κεχαριτωμενη - Lucas 1:28). 

No ventre da Virgem se cumpre a visão da “Escada de Jacó”. Deus desce ao humano, mas também o humano se eleva ao Divino, ou seja, o mistério da Encarnação. Por isto disse Santo Irineu (discípulo do Apóstolo João):

“Deus se fez carne para que o homem se tornasse deus” (Contra as Heresias).

Como a primeira a provar tal realidade (que será realidade em todos), Maria ocupa a primazia, portanto lugar de honra na galeria dos que venceram pela fé, da grande nuvem de testemunha que nos cerca, aquela que todas as gerações louvariam como sendo a mais digna (Lc 1:48) a começar pelo Arcanjo (Lc 1:28) seguido por Isabel e João Batista (Lc 1:41-43). São João, na visão apocalíptica a vê exaltada sobre toda a Criação (Ap. 12:1-2).


Maria gera (não cria) o Filho de Deus, assim como também o Pai na eternidade gerou (não criou) o Seu Filho. Se o Autor entende que o termo “mãe” é inadequado porque confere a Maria existência anterior a Cristo, então a Bíblia estaria errada em usar os termos “Pai" e “Filho” para as duas Pessoas da Santíssima Trindade porque sugerem que Um é Criador e o Outro criatura. No entanto, o Pai “gera” (não cria) o Filho. Assim, os termos “Pai de Jesus Cristo” e “Mãe do Senhor” exprimem relação de existência e não de pré-existência.

Portanto, assim como não devemos deixar de exaltar a leitura das Sagradas Escrituras por medo dos que a distorcem e dão uma conotação mágica à sua leitura, também não devemos, por medo da idolatria, deixar de exaltar devidamente Àquela a qual Deus exaltou e em tudo lhe deu a primazia (exceto sobre Cristo, é claro).

Exaltar a Santa Virgem não rouba em nada a glória devida a Deus, antes a estabelece, porque Deus, que é glorificado em seus santos (2 Tes. 1:10), receberá eterna glorificação por toda glória que Ele nos confere (Ap. 4:8-11).

Glória a Deus que conferiu à Sua humilde serva graça tão indizível (Lc 1:49).


"Ouve, ó filha, e vê, inclina os teus ouvidos; esquece-te do teu povo e da casa do teu pai, Pois o rei se afeiçoou da tua formosura, Ele é teu Senhor. A filha de Tiro o adorará e os ricos do povo suplicarão o teu favor. A tua glória é como a da filha do rei de Esebon; o teu vestido é entretecido de ouro. Levar-te-ão ao rei com vestidos bordados;  virgens para o teu cortejo se trarão a ti. Com alegria e regozijo as trarão; elas entrarão no palácio do rei. Em lugar de teus pais estarão teus filhos; deles farás príncipes sobre toda a terra. Farei lembrado o teu nome de geração em geração; por isso os povos te louvarão eternamente". 
Salmos 44(45):10-17

domingo, 16 de dezembro de 2012

Do Facebook



Tiro no pé II - Pio XII e o Patriarca ortodoxo de Constantinopla

Fazer apologética com os ortodoxos é mais trabalhoso e difícil, reconhecemos. Negociar com 15 denominações ortodoxas separadamente é um problema, pois estes cismáticos estão em cisma não somente em relação a Igreja Católica mas entre eles mesmos.

São autocéfalos, étnicos e nacionalistas no cada um por si. E isto é um grande problema.
.
Salvo engano, os ortodoxos usam o argumento do patriarcado para negar a jurisdição petrina. Como se para eles o governo da Igreja é dividida por igual aos apóstolos.
Na Igreja Católica, a hierarquia dos Patriarcados continuaram, o que muda é realmente o entendimento d’eles. Porque os Patriarcados católicos são autônomos, já entre os cismáticos há os autônomos, mas também há os autocéfalos como eles continuam tratando a questão.

Os bispos ortodoxos receberam o caráter do sacerdócio episcopal, mas não foram imbuídos da autoridade para ensinar, governar e santificar. E são hereges, porque negam e duvidam de doutrinas que foram solenemente definidas, e impostas a eles mesmos, no Concílio de Florença.

Os fiéis mais próximos de uma futura conversão em massa seriam os do Patriarcado de Constantinopla e o Búlgaro.


Resposta:

Caro Manoel, não sei de onde vc tirou este texto ou se é de sua autoria. Seja lá como for, ele revela uma grande ignorância tanto sobre a Santa igreja Católica Ortodoxa como da própria história. Confundir autocefalia e autonomia com cisma é uma estupidez que só vi igual no Cardeal Humberto (este, sim, um vendeiro cismático), ao acusar os gregos de retirar o "filioque" do Credo. Interessante é que na Ortodoxia não temos entre nós movimento carismático, teologia da libertação, modernista, igrejas particulares com direito canônico próprio e com tradições heterogêneas ou qualquer movimento que dê tom diferente à Fé dos Apóstolos, e nós é que somos cismáticos entre si.

Talvez nós devamos estar perdendo a razão por acreditar que a Fé nasceu em Jerusalém e não em Roma, talvez a oligofrênia nos leve a deduzir que o "primado" petrino seja por sucessão histórica primeiramente em Jerusalém e Antioquia (igrejas que existem) até hoje e são dois grandes Patriarcados.

Quem sabe, se um dia recuperarmos a razão, acreditaremos que Cristo foi crucificado em Roma, que os Apóstolos eram romanos, que o Pentecostes aconteceu no Coliseu, que os Apóstolos usavam a Vulgata e não a Septuaginta e que o Novo Testamento fora originalmente escrito em latim e não em grego.

Também deveremos acreditar que as decisões dos Concílios Ecumênicos que normalizam o governo da Igreja em Patriarcados isonômicos e estabelecem as autocefalias e autonomias sejam falsificações históricas grosseiras e acreditar (contrariando todas as provas históricas) que as "pseudo-decretais" e toda lambança jurídica que procura dar ao Bispo de Roma a sucessão direta do primado petrino e conferir-lhe jurisdição universal é que são as autênticas normas eclesiásticas. Ou talvez devemos pensar que as Assembleias Universais (Concílios Ecumênicos) devam ser vista como particulares e as de Roma (apesar de unilateral) como universais. Ora, convenhamos, é preciso uma dose imensurável de ignorância e imbecilidade para ver as coisas dessa maneira. Caso esses fatores condicionantes e limitantes não existam, deveremos pensar no quê? Desonestidade? Farisaísmo?

E por falar em conversão em massa, o Segundo “segredo” de Fátima falava da conversão da Rússia. Historicamente a Rússia deixou de ser ateia para voltar a ser Ortodoxa. Este fato tem abalado a fé de vários clérigos romano-católicos. Ou a profecia era uma mentira ou estaria nossa Senhora tb em cisma com o Papa de Roma? Veja para onde esses desvarios nos levam.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

O Primado de São Pedro na Igreja Ortodoxa



Por Padre Mateus (Antonio Eça)
Vigário do Brasil da Metrópole Ortodoxa do Equador e Amérlica Latina
Santo Sínodo Grego do Calendário Patrístico - GOX

A mídia Ocidental, vez por outra veicula imagens e notícias que mostram uma crescente cordialidade entre o Patriarca de Constantinopla e o Papa de Roma. Estes encontros amistosos e a existência de um canal aberto de diálogo, passam para a população a ideia de que a unidade entre as duas Igrejas está bem próxima; no entanto, a história não é bem assim. Todo esse diálogo e o desejo de reatar a comunhão esbarra bruscamente num ponto: No que vem a ser o Primado Petrino e qual é o papel do Bispo de Roma?

Esta nos parece ser uma discursão sem fim - não porque não haja conhecimento de ambas as partes dos dados da Santa Tradição (e isto inclui as Santas Escrituras) - mas porque outros fatores mediam a interpretação e aplicação desses dados.

Da nossa parte, podemos dizer – sem espírito de soberba e desprezo do outro – que a posição Ortodoxa é inequívoca e sem subterfúgios retóricos e hermenêuticos na abordagem dos dados históricos. E é bom lembrar que a posição que sempre foi - e até hoje é sustentada no Oriente - também foi por vários séculos partilhada pelo Ocidente. Roma somente passou a reivindicar uma jurisdição de caráter universal no séc. IX após a aliança política com o Império Franco (que rivalizava com o Império Romano do Oriente - dito Bizantino pelo Ocidente). Quando a dinastia carolíngia entrou em declínio, os bispos ocidentais buscaram exercer uma primazia sobre o poder temporal com base em uma coleção de documentos jurídicos que mais tarde, em virtude de possuir documentos falsificados - ficaria conhecida como “Decretais do Pseudo-Isidoro”. Esta coleção muniu o Papa Nicolau I (858-867) de base jurídica para reivindicar a primazia papal sobre o poder temporal e uma jurisdição universal.

Tal aspiração papal foi levada pelo Papa Adriano II (867-872) ao III Sínodo de Constantinopla (considerado por Roma como VIII Concílio Ecumênico) e rejeitada pelo mesmo, o qual reafirmou a Pentarquia e o papel do Bispo de Roma como “Primeiro entre Iguais” (Primus inter Pares). Este dado histórico é confirmado na obra “História da Igreja Católica, Edições Loyola (2006), pgs 123, 176”. Tal publicação consiste num ensaio histórico assinado por 10 historiadores (todos com doutorado em teologia, dos quais 9 são Sacerdotes Romanos e vários deles doutores em história eclesiástica com especialização em patrologia). Portanto, isto não é nenhuma digressão Oriental.

A Igreja Ortodoxa entende que Cristo conferiu a Pedro o primado entre os Apóstolos, mas em bases muito distintas do ensino romano:

Primeiramente, primado não é chefia, mas uma posição de honra (como a de um irmão mais velho). As Escrituras narram no Livro dos Atos dos Apóstolos a realização do primeiro concílio realizado na Igreja, ocorrido na cidade de Jerusalém, do qual participaram todos os Apóstolos, vários Presbíteros e irmãos da Igreja local. O interessante é que a narrativa demonstra que, embora Pedro se fizesse presente e usasse da palavra, a presidência do Concílio foi exercida por São Tiago, e é o parecer deste que é acatado, expressando sua fala a unidade do Concílio e a direção do Espírito Santo (Atos 15:1-29). Curioso também, é que na sua fala, São Pedro se refere à sua primazia, não como chefe dos Apóstolos, mas como aquele que teve a honra de ser eleito por Deus para ser o primeiro a anunciar o Evangelho aos gentios (Pedro é quem abre as portas da Igreja para os gentios entrarem, assim como ele no Pentecostes abriu as portas da Igreja para os judeus e prosélitos dispersos entre as nações). Deus lhe conferiu esta primazia, no entanto, tempos mais tarde, o Colégio Apostólico entenderá que a primazia entre os gentios, agora era por Deus conferida ao Apóstolo Paulo, ficando Pedro com os judeus (Gal. 2:7).

Em segundo lugar, na hipótese de ser Pedro o chefe dos Apóstolos, por que razão esta chefia seria herdada pelo bispo de Roma, se Pedro exerceu primeiramente seu pontificado na Palestina e não em Roma?

Ioannis Zizioulas
O Metropolita de Pérgamo, Ioannis Zizioulas diz pertinentemente que “os católicos devem levar a sério a noção de plena catolicidade da Igreja local promovida pelo Concílio Vaticano II, e devem aplicá-la a sua eclesiologia.” Isto é, se cada Igreja Local é verdadeiramente católica - pois ao celebrar a Eucaristia a Igreja Local entra em comunhão com todas as demais Igreja na terra e também com a Celeste - então, os Bispos que as presidem exercem localmente o primado, ou seja, a função de Pedro entre os Apóstolos.

Alban Mosher resume de forma muito feliz como o Primado Petrino é exercido na Igreja Ortodoxa:

“Todo bispo Ortodoxo que partilha corretamente a palavra de Verdade é um sucessor de São Pedro e todos os Santos Apóstolos... Todo bispo Ortodoxo em sua diocese é responsável pela preservação da unidade da igreja local e é a fonte daquela unidade. 
 Dioceses locais então se reúnem e formam um sínodo regional, com o bispo da cidade mais importante sendo o Metropolita daquele sínodo local. O Metropolita também exerce a Cátedra de São Pedro no sínodo local e é responsável pela unidade do sínodo local. 
 Vários sínodos locais então se reúnem e formam um sínodo regional, no qual o primeiro hierarca daquele sínodo regional possui o título de Arcebispo. Ele também é responsável pela unidade do sínodo regional e exerce a Cátedra de São Pedro entre eles. 
 Alguns desses Arcebispos também possuem o título de Patriarca de acordo com a história e lugar de honra pela importância da cidade que ele representa. Esta cidade geralmente é uma capital nacional, ou uma cidade associada com os Apóstolos. Desse modo, Sua Beatitude o Patriarca Ignatius IV é também um sucessor de São Pedro, que foi o primeiro bispo de Antioquia.” [1]

É também muito interessante vermos, de forma resumida, alguns dados históricos:

São Pedro e São Paulo
1.         A igreja indivisa conferiu a Roma uma primazia (e não uma jurisdição universal), de natureza disciplinar e não dogmática; e a Igreja ao se organizar juridicamente, a fim de uma melhor sintonia administrativa com o Imperador, retira do modelo de organização do Império Romano o seu modelo eclesiástico, ou seja, a Tetrarquia (Roma, Alexandria, Antioquia e Jerusalém). A Igreja se organiza administrativamente a partir de uma perspectiva teológica que ficou conhecida como "Sinfonia Bizantina" que reza sobre a independência e harmonia entre o poder Patriarcal e o Imperial.

2.         Roma foi escolhida para ser primeira por critério disciplinar e administrativo, e não por critério teológico; por ser a capital do Império, ela também deveria exercer a Primazia Patriarcal. Assim, quando o Imperador institui Constantinopla como Capital do Império no Oriente, os Concílios estabelecem sua paridade eclesiástica com Roma. Isto gerou uma gritaria em Roma porque esta estava sob domínio bárbaro e via dia a dia seu prestígio se esvanecer, e sua glória se transferindo para a nova capital Imperial, Constantinopla.

3.         A primazia na Igreja nunca foi confundida com jurisdição universal. Como bem demonstra Alba Mosher, esta é uma prerrogativa inerente a todos os Metropolitas ou Arcebispos Primazes. Modelo de Primazia partilhada nós já encontramos nas Santas Escrituras quando os Apóstolos reconhecem a primazia de Pedro sobre os cristãos judeus e a de Paulo sobre os cristãos gentílicos (Gálatas 2:7).

4.         Se o critério para estabelecer uma Sé Primaz se firmasse com base histórica na Cátedra Petrina, esta honra deveria caber a Antioquia (onde os discípulos pela primeira vez foram chamados de cristãos – Atos 11:26) e não a Roma, pois Antioquia foi a primeira Sé de Pedro (atestada pelas próprias Escrituras), foi nela e por ela que se deu a vocação, ordenação e envio do Apóstolo Paulo aos gentios. Portanto, Antioquia é a mãe da Igreja dos gentios (incluindo Roma). Pedro (o Primaz da circuncisão e Paulo o Primaz da Incircuncisão), tiveram suas primeiras Cátedras em Antioquia. Quando Roma ainda era um centro pagão, Antioquia já refulgia magnânima o seu resplendor para o mundo.

5.         A ideia de infabilidade papal não era desconhecida somente dos Ortodoxos, mas também dos próprios Cristãos Ocidentais, e isto não apenas nos primeiros séculos, mas até o século XIX, precisamente até o ano de 1870, ano em que transcorreu o Concílio Vaticano I, cuja Constituição de Fé promulgou o dogma da infabilidade papal. No entanto, esta decisão conciliar (para qual não faltaram manobras e artifícios políticos), se deu em meio a grande tumulto entre os bispos romanos, gerando até mesmo um cisma. Este cisma fez surgir a Igreja Vétero-Católica, a qual em sua gênesis se constituiu de um grande número de clérigos (bispos e padres) que se opunham a esta inovação sem fundamento eclesiológico convincente e contrária à Tradição. Eis os três primeiros tópicos da Declaração de Fé, firmada pelos Bispos e Padres dissidentes, declaração esta que ficou conhecida como a “União de Utrecht” (1889):
I.          Aderimos a Regra de Fé formulada por São Vicente de Lérins nestes termos: "Teneamus Id, quod quod, semper ubique, quod ab omnibus est Creditum; hoc est etenim Catholicum proprieque vere"(Afirmemos aquilo em que se tem acreditado em todas as partes, sempre e por todos, porque isso é verdadeiro e propriamente Católico). Assim sendo, conservamos e professamos nossa fé nas doutrinas da Igreja Primitiva expostas nos Símbolos Ecumênicos e especificadas nas decisões dos Concílios realizados pela Igreja indivisa do primeiro milênio. 
II.         Por isso, rejeitamos os decretos do Concílio Vaticano, que foram promulgados em 18 de Julho de 1870 relativos à infalibilidade e ao Episcopado Universal do Bispo de Roma, decretos que estão em contradição com a fé da Igreja Antiga, e que destroem sua constituição canônica, atribuindo ao Papa a plenitude dos poderes eclesiásticos sobre todas as Dioceses e sobre todos os fiéis. Pela negação de sua competência primacial, não queremos negar a primazia histórica que vários Concílios Ecumênicos e os Padres da Igreja antiga atribuíram ao Bispo de Roma, reconhecendo-o como o Primus inter pares. 
III.        Rejeitamos o dogma da Imaculada Conceição promulgado pelo Papa Pio IX em 1854, a despeito das Sagradas Escrituras e em contradição com a Tradição dos primeiros séculos.

Acho muito difícil que tal unidade possa acontecer. Por que? Porque do lado Ortodoxo, abrir mão da Santa Tradição é algo que seria negar a nossa própria identidade e alma, isto sem falar da firme convicção de que a Igreja é Fiel Guardiã do Depósito da Fé, não tendo autoridade nenhuma para nele mexer (alterando, somando ou subtraindo), pois, se assim o fizer, cai em apostasia e fica sob Juízo Divino. Do lado Romano,  renunciar ao seu dogma particular, é fazer desmoronar toda uma estrutura sedimentada por cerca de um milênio, o que lançaria descrédito em toda sua história e faria do seu apogeu Ocidental um castelo de areia. Renunciar à riqueza e à glória não é coisa fácil. O Jovem Rico que o diga. No entanto, para Deus, nada é impossível.





[1] Alban Mosher, Leitor da Paróquia Ortodoxa Grega de Santa Catarina do Sinai (EUA).