Homilia proferida por São Gregório Nazianzeno, Séc. IV
O sábio não se gabe de sua sabedoria, o rico não se glorie de sua riqueza (Jr 9,22), o forte de sua fortaleza, mesmo que tenham chegado ao cume da sabedoria, da riqueza e do poder. De minha parte, acrescentarei algo semelhante: não se exalte pela sua glória quem é famoso e célebre; pela sua robustez quem goza de ótima saúde; pela sua formosura o que é belo; pela sua idade quem é jovem; numa palavra, nenhum soberbo ou vaidoso se ufane de qualquer coisa, que suscita louvor neste mundo; pelo contrário, quem se gloria, glorie-se de uma só coisa: de conhecer e de buscar a Deus e de, compadecendo-se dos infortunados, armazenar bens para a vida eterna.
O resto, frágil e passageiro como num jogo de bola, é lançado e transferido de uma a outra mão. Ninguém possui algo que escape à usura do tempo ou que, com desagrado, não passe a outrem. Quanto aos outros bens, são estáveis, seguros, jamais hão de falhar ou de dissolver-se; jamais será frustrada a esperança de quem neles confia.
Por que razão nenhuma posse é estável e duradoura nesta terra? Por que tudo aquilo, apesar de feito pelo Verbo e sua sabedoria que supera nossa inteligência, nos deixa desiludidos? Por que as coisas mudam, ora num sentido ora noutro, ora são exaltadas ora rebaixadas e, antes de tê-las nas mãos, já nos escapam e fogem? Parece-me que a razão de tudo isso está no fato de sua própria instabilidade e variedade nos incitarem a nos dirigirmos ao porto da vida futura. Na verdade, o que faríamos se – embora flutuante e frágil – a prosperidade fosse inabalável, para nós que estamos acorrentados e reduzidos à escravidão por sua falaciosa avidez, a ponto de pensarmos que não existe algo de melhor e de mais precioso que as coisas da terra? E tudo isso ocorre, embora estejamos convictos de que fomos criados à imagem de Deus, que está no céu e nos atrai a ele.
Quem é sábio, compreenda (Sl 106/107,43). Quem é capaz de abandonar as coisas transitórias, de cuidar das que não passam, de considerar os bens presentes como se não existissem? Feliz aquele que com a espada do Verbo sabe discernir entre o bem e o mal e separá-los; deixando de lado o mal, decide em seu coração principiar a santa peregrinação, como diz o salmista Davi; fugindo deste vale de lágrimas procura, com todas as suas forças os bens do alto; crucificado para o mundo com Cristo, com Cristo ressurge e com ele sobe ao céu, herdeiro de uma vida que não passa nem decepciona, onde a serpente não nos morde no percurso nem arma ciladas ao calcanhar, já lhe tendo sido esmagada a cabeça.
O profeta Miquéias, observando este fato, exclama, zombando dos répteis e de tudo aquilo que de bem só tem a aparência: De pé! Andai, não é hora de descanso! (Mq 2,10). Neste mesmo sentido, exorta-nos nosso Senhor e Salvador: Levantai-vos! Vamo-nos daqui! (Jo 14,31). Com tais palavras, transferia daquele lugar não só os que eram então seus discípulos, mas também todos os outros que viessem a crer; desprendia da terra e dos bens terrenos todos os seus seguidores, a fim de orientá-los para o céu e seus tesouros.
Sigamos, portanto, o Verbo; procuremos o repouso prometido; desprezemos as riquezas e o conforto desta vida, enriquecendo-nos somente com o que tenham de bom. Sejamos salvos pelas esmolas, distribuindo aos pobres os nossos haveres, a fim de nos engrandecermos com os bens celestes.
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