Creio que compreendeis, que estas duas mulheres, ambas dilectas do Senhor, dignas do seu amor, e Suas discípulas [...], que estas duas mulheres são, por conseguinte, a imagem de duas formas de vida: a vida deste mundo e a vida do mundo futuro, a vida de trabalho e a vida de repouso, a vida nas preocupações e a vida na bem-aventurança, a vida no tempo e a vida eterna.
Duas vidas: meditemos mais longamente sobre elas. Consideremos de que é feita esta vida: não me refiro a uma vida censurável [...], a uma vida de vícios, de impiedades; não, falo de uma vida de trabalho, carregada de provações, de angústias, de tentações, de uma vida que não tem nada de culpável, de uma vida que era efectivamente a de Marta. [...] O mal estava ausente desta casa, tanto em Marta como em Maria; se estivesse presente, a chegada do Senhor tê-lo-ia dissipado. Duas mulheres aí viveram e as duas receberam o Senhor, duas vidas admiráveis, rectas, uma feita de trabalho, a outra de repouso. [...] Uma de trabalho, mas livre de perturbações, que são obstáculo à vida entregue à acção; a outra isenta de ociosidade, que é obstáculo à vida contemplativa. Havia nesta casa as duas vidas, mas a fonte era a mesma. [...]
A vida de Marta é o nosso mundo; a vida de Maria é o mundo que esperamos. Vivamos este mundo com rectidão, para obtermos o outro em plenitude. Que possuímos já dessa vida? [...] Precisamente, neste momento, vivemos de certa maneira essa vida: afastando o trabalho, pondo de parte as preocupações familiares, reuni-vos e escutais. Comportando-vos assim, assemelhais-vos a Maria. Isso torna-se-vos mais fácil do que a mim, que tenho de tomar a palavra. No entanto, o que digo é a Cristo que vou buscá-lo, e este alimento é de Cristo. Porque é o pão comum a todos, e é para isso que vivo em comunhão convosco.Santo Agostinho (354-430), Bispo de Hipona (Norte de África)
Fonte: Evangelho Quotiniano
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