domingo, 3 de março de 2019

O Jejum e a Grande Quaresma



O Triódion


A Grande Quaresma é o período de 40 dias de preparação espiritual que vem antes da festa mais importante do ano cristão, a Santa “Pascha” (que significa "Pássagem" e é comumente chamada de "Páscoa"). Esta é a parte central de um período maior de preparação chamado de “Tempo do Triódion”.

O Triódion começa dez semanas antes da Páscoa e é dividido em três partes principais: Três semanas de Pré-quaresma para  preparar nossos corações; as seis semanas da Quaresma e a Semana Santa. O tema principal do Triódion é o arrependimento - o retorno da humanidade a Deus, nosso amoroso Pai.

Esse período anual de arrependimento é uma jornada espiritual com nosso Salvador. Nosso objetivo é encontrar o Senhor Jesus ressuscitado, que nos reúne com Deus-Pai. O Pai está sempre esperando para nos receber com as mãos estendidas. Devemos nos perguntar: "Estamos dispostos a recorrer a Ele?"

Durante a Grande Quaresma, a Igreja nos ensina como recebê-lo usando
os dois grandes meios de arrependimento - oração e jejum.


O Jejum da Quaresma

A palavra “jejum" significa não comer todos ou determinados alimentos. Como Fiéis Ortodoxos, praticamos um jejum estrito em certos momentos de grande importância, e especialmente cada vez antes de receber a Sagrada Comunhão. Usualmente, jejum significa limitar o número de refeições e / ou o tipo de alimento comido.

O propósito do jejum é lembrar-nos do ensinamento bíblico, “o homem não vive só de pão.” As necessidades do corpo não são nada em comparação com as necessidades da alma. Acima de tudo, precisamos de Deus, que tudo fornece para o corpo e a alma. O jejum nos ensina depender de Deus mais plenamente.

O primeiro pecado de nossos pais, Adão e Eva, foi comer da árvore proibida (Gênesis 3: 1-19). Nós jejuamos de comida, ou um item de comida, como um lembrete de que devemos jejuar de pecar e praticar o mau.

Existem vários benefícios do jejum. O jejum nos ajuda a orar mais facilmente. Nosso espírito fica mais leve quando não estamos sobrecarregados com muita comida ou comida que é muito carregada. Através do jejum, também aprendemos a sentir compaixão pelos pobres e famintos e a gerir nossos próprios recursos de modo que possamos ajudar os necessitados.

O jejum é mais do que abster-se de comida. São João Crisóstomo ensina que é mais importante jejuar do pecado. Por exemplo, além de controlar o que entra em nossas bocas, devemos controlar, também, o que sai de nossas bocas. Nossas palavras são agradáveis ​​a Deus, ou amaldiçoamos a Deus ou ao nosso irmão?

Outros membros do corpo também precisam jejuar: Os nossos olhos de contemplarem o mau, nossos ouvidos de ouvir o mau, nossos membros de participar qualquer coisa que não seja de Deus. O mais importante de tudo é que precisamos controlar nossos pensamentos, pois os pensamentos são a fonte de nossas ações, sejam boas ou más.

O jejum não é um fim em si mesmo. Nosso objetivo é uma mudança interna de coração. O Jejum da Quaresma é chamado de "ascético". Isto se refere a ações de autonegação e de exercício espiritual que são centrais para o jejum.

O jejum é um exercício espiritual. Não é imposto nem imposto a nós. E da mesma forma que o verdadeiro arrependimento não pode ser imposto a ninguém, cada um de nós faz a escolha de se afastar de nossos caminhos pecaminosos e ir em direção ao amor, dado  pelo nosso Pai celestial.

As Semanas Antes da Quaresma


Antes da Grande Quaresma começar, quatro lições de domingo nos preparam para o Jejum. A humildade é o tema do primeiro domingo, chamado “O Domingo do Publicano e do Fariseu”. A parábola do Senhor em Lucas 18: 10-14 ensina que o jejum praticado com orgulho é rejeitado por Deus. Por esse motivo, não há jejum na semana seguinte a este domingo. Isso inclui os jejuns da quarta e sexta-feira daquela semana. (Quartas e sextas-feiras são geralmente dias de jejum durante todo o ano - o jejum  de quarta-feira relembra a traição de Cristo por Judas; o jejum de sexta-feira comemora a crucificação do Senhor).

O arrependimento é o tema do segundo domingo pré-quaresmal, chamado “O Domingo do Filho Pródigo”. Antes de podermos retornar a Deus, precisamos reconhecer que estamos longe de Deus por causa do pecado. Como o  Filho pródigo (Lucas 15: 11-32), estamos em um  exilio auto imposto. Chegaremos a nossos sentidos como fez o filho pródigo e voltaremos ao nosso pai?

O próximo domingo é chamado tanto de “Domingo da Abstenção de Carne”, como de “Domingo do Último julgamento”. O segundo nome refere-se à lição do Evangelho lido neste dia (Mateus 25: 31-4 6). O Senhor nos diz que no último dia seremos julgados de acordo com o amor que temos mostrado para o nosso irmão. "Eu estava faminto.. com sede...nu.... era estrangeiro ... na prisão ... doente ... o que fizeste a um dos menores dos meus irmãos, a Mim o fizeste. Esmolas andam de mãos dadas com o jejum. Este domingo é chamado de  Abstenção de Carne”, porque é o último dia em que carne, peixe ou aves são comidos antes da Páscoa, para aqueles que praticam o Jejum da Quaresma.

O último domingo pré-quaresmal é chamado de “Domingo da abstenção de Queijo” e de “Domingo do Perdão”. Este é o último dia em que os produtos lácteos são comido antes do jejum. A lição do Evangelho lido neste dia (Mateus 6: 14-21) nos diz que nosso jejum não deve ser hipócrita ou "aparecer". Nosso trabalho e nossa aparência continuarão como sempre, e nossos esforços extras, devem ser conhecidos apenas por Deus. A leitura do Evangelho também nos lembra que Deus, o Pai, nos perdoará da mesma maneira que nós perdoamos nosso irmão. Com esta promessa de perdão, a Grande Quaresma começa no dia seguinte, que é chamado de “Segunda-feira da Purificação”. A “Segunda-feira da Purificação é dia de  jejum total, exceto por um pouco de água. Nenhuma outra bebida ou comida é consumida.


Regras Gerais do Jejum da Quaresma

As regras do Jejum da Quaresma que observamos hoje, foram estabelecidas pelos mosteiros da Igreja Ortodoxa durante o período do  sexto ao décimo primeiro séculos. Essas regras são destinadas a todos os Cristãos Ortodoxos, e não apenas aos monges e freiras.

A primeira semana da Quaresma é especialmente rigorosa. Na segunda-feira, terça e Quarta-feira, um jejum total é mantido. Na prática, muito poucas pessoas conseguem fazer isso. Alguns acham necessário comer um pouco a cada dia após o pôr do sol. Muitos fiéis jejuam completamente na segunda-feira e depois comem apenas comida crua (pão, frutas, nozes) na terça-feira à noite. Na quarta-feira, o jejum é mantido até depois da Liturgia dos Dons Pré-santificados.

Da segunda até a sexta semana da Quaresma, as regras gerais para o jejum são praticadas. Carnes, produtos de origem animal (queijo, leite, manteiga, ovos, banha de porco), peixe (ou seja, peixe com espinha dorsal), azeite e vinho (bebidas alcoólicas) não são consumidas durante os dias da semana da Grande Quaresma. Polvo e marisco são permitidos, assim como o óleo vegetal. Nos fins de semana, azeite e vinho são permitidos.

De acordo com o que foi estabelecido nos mosteiros, pode-se fazer uma refeição ao dia durante a semana e duas refeições nos fins de semana na Grande Quaresma. Nenhuma restrição é colocada sobre a quantidade de comida durante a refeição, embora a moderação seja sempre incentivada em todas as áreas da vida em todos os momentos.

Peixe, óleo e vinho são permitidos na Festa da Anunciação (25 de Março) e no Domingo de Ramos (uma semana antes da Páscoa). Em outros dias de festa, como o Primeiro e Segundo Encontro da Cabeça de São João Batista (24 de fevereiro), os Santos Quarenta Mártires de Sebaste (9 de março), a Festa da Anunciação (24 de março) e a Sinaxys do Arcanjo Gabriel (26 de março), vinho e óleo são permitidos.


SEMANA SANTA

A semana antes da Páscoa, a Semana Santa, é um momento especial de jejum separado da Grande Quaresma. Como na primeira semana, um jejum estrito é mantido. Alguns Cristãos Ortodoxos tentam manter um jejum total na Segunda, Terça e Quarta-feira santas. A maioria come uma refeição quaresmal simples no final de cada dia antes de ir ao ofício noturno.

Na Quinta-feira Santa, o vinho é permitido em memória da Última Ceia. A sexta-feira santa é mantida como um dia estrito de jejum, assim como o Sábado Santo. O Sábado santo é o único sábado em todo o ano em que o óleo não é permitido.

Em suma, estas são as regras da Quaresma para o jejum. Tradicionalmente, os Padres da Igreja recomendam que são novatos na prática do jejum, comecem com a firme decisão de fazer fielmente, tanto quanto ele ou ela são capazes, durante o período da Quaresma.

Todos os anos, à medida que se amadurece como cristão, uma participação mais completa pode ser realizada. No entanto, não é recomendável que uma pessoa tente criar suas próprias regras para o jejum, uma vez que isso não seria nem obediente ou sensato. Os Fiéis são encorajados a consultar seu Sacerdote ou Bispo quanto ao jejum, quando possível.

Fatores pessoais como saúde e situação de vida precisam ser também ser considerados. Por exemplo, um Cristão Ortodoxo isolado, obrigado a fazer refeições no local de trabalho, escola ou na prisão pode não ser capaz de evitar certos alimentos. A Igreja entende isso e estende leniência.

É importante ter em mente que o jejum não é uma lei para nós; tão somente uma maneira voluntária de lembrar de não pecar e fazer o mau, e ajudar a manter nosso foco em oração, arrependimento e atos de bondade, pois nós "estamos, não debaixo da lei, mas debaixo da graça ” (Romanos 6:14).


PÁSCOA, SEMANA LUMINOSA E O PERÍODO PASCAL

O Jejum da Quaresma é quebrado após o serviço da Páscoa da meia-noite. Com a proclamação: "Cristo ressuscitou!", começa o tempo do banquete. A semana após a Páscoa é chamada de “Semana Luminosa”  e não há jejum. Nos próximos 40 dias, a Igreja celebra a época pascal (Páscoa). Alegria e ação de graças é a realização de nossa jornada quaresmal.


Uma Oração Para a Quaresma

A oração de São Efraim, o sírio, é tradicionalmente dita muitas vezes ao longo de cada dia durante a Grande Quaresma, além de nossas orações diárias.

“Ó Senhor e Mestre de minha vida, tire de mim o espírito de preguiça, desespero, desejo de poder e de palavras ociosas; (+)

Mas, ao contrário, dê o espírito de humildade, castidade, paciência e amor ao Teu servo. (+)

Sim, ó Senhor e Rei, concede-me ver as minhas próprias transgressões e não julgar
meu irmão, pois, Bendito És Tu, pelos séculos dos séculos. Amém!” (+)

Obs.: O "(+)" indica que aqueles que oram fazem uma profunda reverência ou
prostração neste momento.)

Fonte: Pravoslavie.ru
Tradução: Ray Macedo
Revisão: Padre Mateus